quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

III Conferência Brasileiros no Mundo em Zurique

Cerca de 70 pessoas participaram no dia 5 de fevereiro em Zurique da reunião informativa promovida pelo Consulado Geral do Brasil sobre os resultados da III Conferência “Brasileiros no Mundo”, realizada em dezembro de 2010 no Rio de Janeiro. A cônsul Geral do Brasil em Zurique, Embaixadora Vitória Cleaver, ressaltou a importância de informar a comunidade sobre os debates da conferência, a fim de que todos possam tomar parte nesse processo de diálogo entre o governo brasileiro e seus cidadãos no exterior.
Em sua saudação a embaixadora Vitória declarou que a Conferência do Rio “representa o ponto culminante de um processo que começou há 10 anos com as reuniões de Lisboa, Boston e Bruxelas, seguidas pelas duas primeiras Conferências”. A importância do encontro realizado no ano passado, segundo ela, reside no fato de marcar a criação do CRBE, que foi empossado pelo então presidente Lula. “Esse órgão será um instrumento de comunicação dos senhores com as autoridades em Brasília”, afirmou. Para Vitória Clever outro ponto de destaque é a Ata Consolidada de Reivindicações, “um documento dinâmico e que será constantemente atualizado”.
O evento contou com a presença de Carlos Mellinger (UK), conselheiro titular eleito para o Conselho de Representantes de Brasileiros no Exterior (CRBE) pela Europa, que veio especialmente de Londres para explicar o que é o Conselho e como a comunidade pode fazer contato com os conselheiros para enviar suas propostas e reivindicações.
Convidados especiais foram também os participantes da III Conferência residentes na Suíça: o cônsul do Brasil em Genebra, Embaixador Ernesto Rubarth, o membro suplente do CRBE pela Europa, Rui Martins, Lúcia Amélia Brüllhardt, Ocirema Kukleta e Pedro da Silva Neves. Cada um deles relatou sobre suas experiências durante o evento do Rio de Janeiro, dando ao público uma ideia da dimensão do encontro.
Retrospectiva
No início dos trabalhos Regina Jomini, do Conselho Brasileiro na Suíça, fez uma retrospectiva sobre a origem das Conferências “Brasileiros no Mundo”, reportando-se aos encontros realizados por iniciativa de associações de brasileiros no exterior desde 1997 e que finalmente conseguiram chamar a atenção do governo brasileiro. Somente a partir da I Conferência “Brasileiros no Mundo”, realizada em 2008, o governo do Brasil tomou à frente da iniciativa de fazer contato com os brasileiros emigrados, enfatizou.
Para Ocirema Kukleta, essa mudança de posicionamento do MRE em relação aos brasileiros no mundo foi o ponto mais importante da Conferência. Ela lembrou que no encontro de brasileiros em Bruxelas (2007) o MRE nem se fez representar. “Agora, na III Conferência, o MRE estava participando em peso. Antes, ninguém se importava. Agora no Rio, vários ministros, o governador do Rio de Janeiro e o prefeito da cidade estavam presentes, e o presidente Lula veio prestigiar o encontro, fazendo um discurso voltado para a população emigrante e dando posse ao CRBE”, destacou.
O embaixador Ernesto Rubarth compartilha dessa visão e acredita que existe uma vontade do governo brasileiro de colocar em andamento as propostas apresentadas nas Conferências “Brasileiros no Mundo”. Ele enxerga esse momento como um avanço no relacionamento entre o governo e a comunidade brasileira no exterior.
Nesse sentido, o embaixador destaca dois pontos principais: “Primeiro, existe um conjunto bem organizado de reivindicações das diferentes comunidades, que mostra as carências e o que precisa ser desenvolvido. Segundo, existe um firme compromisso do governo do Brasil para atender a essas reivindicações, num esforço conjunto do MRE com os outros ministérios”.
Contato direto com o CRBE
O conselheiro titular do CRBE, Carlos Mellinger, salientou que é muito importante verificar que muitas demandas já estão incluídas na Ata Consolidada e deve-se evitar duplicações. “O que consta da Ata já está em andamento. É importante receber propostas novas, complementos, correções, inclusões, cobranças”, afirmou. Segundo ele, “a função principal do CRBE é ouvir as demandas da comunidade, organizar essas demandas e apresentá-las para o governo, auxiliando para que a IV Conferência “Brasileiros no Mundo”, a ser realizada possivelmente em outubro deste ano em Brasília seja mais objetiva que as anteriores e que sejam evitados alguns problemas sentidos na III”.
Carlos destacou a importância da participação de todos os presentes e informou o site onde podem ser obtidas mais informações:www.brasileirosnomundo.mre.gov.br e no qual também existe um E-Mail de contato com o CRBE. Assim que o trabalho de revisão das atas resultantes dos trabalhos nas mesas temáticas estiver concluído, os textos serão publicados e será definido o que será acrescentado à Ata Consolidada, que foi distribuída aos presentes na reunião de Zurique. Para facilitar o contato com a comunidade Carlos divulgou também seu E-Mail pessoal que está sendo usado nesse trabalho: carlosuk@aol.com.
Menos otimista em relação ao CRBE é o conselheiro suplente eleito pela Europa, jornalista Rui Martins, que reside na Suíça e trouxe ao evento uma carta de saudação do presidente do CRBE, Carlos Shinoda, do Japão. O jornalista destacou a falta de representatividade do Conselho em relação à população brasileira no exterior. Citando seu exemplo, diz que com os 148 votos que recebeu não pode querer representar uma população brasileira estimada entre 35 e 50 mil pessoas na Suíça. Além disso, chamou a atenção para a falta de definição de um orçamento para o trabalho do CRBE. “Nós não temos condições - aliás, eu não, pois sou só suplente – de fazer muita coisa, pois não temos verba”, afirmou.
Entre as propostas que apresentou no Rio de Janeiro, Rui defendeu que nos países onde não há conselheiro titular, o suplente possa participar das reuniões como se fosse titular. Esse é o seu caso, na Suíça, e também o caso dos suplentes do Uruguai, Argentina, Equador e Guiana Francesa.
Usando uma frase de Carlos Shinoda, para quem “o CRBE é o primeiro passo”, Rui defende como bandeira principal que a presidente Dilma Roussef decrete a criação de uma Secretaria de Estado da Emigração. “Alguns dizem que tem que se começar pelas bases, tem que começar de baixo. Pode começar de baixo, mas por cima. A presidente Dilma representa as bases”, afirmou. Como parte de sua proposta seriam eleitos também parlamentares dos emigrantes. “Daí o CRBE deslancha, porque daí esse ministro ou secretário de estado vai dar verba e isso vai começar a funcionar e vai ficar coisa séria”, reforçou. Rui declarou que está em campanha nesse sentido, pois “temos que ser os senhores da nossa história de emigrantes e fazer com que o governo nos ouça de verdade, porque nós teremos uma Secretaria de Estado ou então um super ministério que vai interessar muitos políticos, agregando migração, imigração e emigração”.
Carlos Mellinger contrapôs os argumentos de Rui e sua queixa de não poder fazer muito como suplente. Ele enfatizou que agora existe esse canal de interlocução e declarou que não precisa de títulos para trabalhar em prol da comunidade. “Eu não sou o Carlos, conselheiro titular do CRBE. Eu sou o Carlos, que faz a mesma coisa desde 2005, só que agora na Europa e oficial, ou seja, reconhecido pelo governo brasileiro”, afirmou. Ele desafiou Rui a continuar fazendo seu trabalho e ouvindo todas as vozes da comunidade, de maneira imparcial, reconhecendo que não existe uma única verdade. Para Carlos, as diferenças entre titular e suplente estão apenas no decreto do CRBE assinado pelo ex-presidente Lula e não na forma de trabalhar.
Estatuto do Emigrante
Outro tema diretamente ligado à cidadania do brasileiro no exterior foi abordado pelo advogado Pedro da Silva Neves, de Genebra, que participou da III Conferência como convidado oficial indicado pela Suíça. Entre as diversas propostas que levou em nome do Conselho Brasileiro na Suíça, Pedro concentrou seus esforços na defesa de duas: os acordos entre o Brasil e a Suíça no âmbito da previdência social e o projeto do Estatuto do Emigrante Brasileiro.
Pedro enfatizou que já existem negociações em andamento na área da Previdência, mas reforçou no Rio que é preciso garantir a recuperação das contribuições feitas nos dois países e informar a comunidade sobre as formalidades para a obtenção dos benefícios.
Em relação ao projeto do Estatuto do Emigrante Brasileiro, o advogado explicou que a iniciativa “congrega todos os brasileiros sob uma bandeira, é um projeto comum, onde todos nos identificamos”. Ao reconhecer que os brasileiros no exterior tem sua cidadania fragilizada em função das dificuldades que enfrentam, Pedro acredita que “com o estatuto seremos reconhecidos como um segmento da comunidade brasileira que precisa de atenção específica do governo, assim como existe o estatuto de outros segmentos, por exemplo dos idosos, das crianças, do índio.”
Lúcia Amélia Brüllhardt, presidente da ONG Prevenção Madalena’s, lembrou que um exemplo de fragilidade pode ser visto também na Suíça, onde há muitos brasileiros em situações ultrajantes e de exploração, que necessitam de assistência social e de ter respeitados seus direitos humanos.
Lúcia relatou sobre os avanços realizados pelo Itamaraty em convênio com diversos países, como Espanha, Portugal, Holanda e Suíça para a formação de uma ampla rede de parceria para assistência a brasileiras e brasileiros vítimas do tráfico de pessoas, da exploração sexual, laboral e violência doméstica. Ela comemora esses acordos como uma vitória, principalmente para pessoas que estão há anos trabalhando nessa área, como Carminha Pereira, do FIZ, Vicente Medeiros, do Projeto Resgate e outros. Mesmo assim propõe um trabalho mais unificado entre o Consulado e as associações, para prestar ajuda às pessoas e oferecer por exemplo assistência jurídica com tradutores de língua portuguesa lá onde as pessoas estão, por exemplo nas prisões.
Assistência consular
Nesse sentido, a embaixadora Vitória Cleaver deu ao público uma boa notícia: o Consulado de Zurique contratou um advogado para prestar atendimento jurídico uma vez por semana. Essa é uma das diversas iniciativas que já estão sendo tomadas pelo Consulado no sentido de melhor atender a comunidade. Outra medida será a realização, nos próximos meses, de dois consulados itinerantes, um na cidade de Biene e outro na suíça italiana. A embaixadora reconheceu que a região do Ticino, por exemplo, tem sido atendida com sacrifício, em função da distância da sede do Consulado.
No que se refere ao atendimento dentro do Consulado, a embaixadora afirmou que as novas instalações, a introdução do sistema de senhas e de uma máquina para compra de bebidas, entre outras facilidades, permitiram uma melhora considerável no atendimento ao público. A mais recente inovação será a instalação de um terminal bancário, para que os pagamentos possam ser realizados no próprio consulado.
Em seu relato sobre a mesa de trabalho relativa à Assistência Consular, o embaixador Ernesto Rubarth listou e comentou as diversas propostas registradas, entre elas a de simplificação do processo de homologação de divórcio no Brasil. Também foi proposto que sejam realizadas reuniões regulares das coordenações consulares, a fim de que o procedimento nos diversos consulados seja similar. O acesso a fontes de financiamento, especialmente para projetos de apoio à comunidade apresentados por associações brasileiras no exterior foi outro tema levantado nessa mesa de trabalho na Conferência, que ainda discutiu o aumento dos esforços para cumprir a convenção relativa a sequestro de menores.
A participação ativa do público se fez sentir nos diversos questionamentos, sugestões e comentários levantados depois das apresentações. Temas como educação, cultura e incentivo ao trabalho voluntário tiveram destaque especial. Chamou-se atenção também para a situação dos jovens que crescem num ambiente binacional e por vezes ficam perdidos entre as duas culturas.
Passos para o futuro
Olhando para o futuro, uma das consequências diretas da Conferência no âmbito da interação entre o governo brasileiro e a comunidade é a determinação de que sejam formados Conselhos de Cidadania em cada jurisdição consular. Com membros eleitos de forma direta pelos brasileiros da região, esses grupos devem funcionar como apoio ao Consulado e como elemento de ligação entre as autoridades brasileiras e seus emigrantes nos diversos países.
A embaixadora Vitória Cleaver anunciou que está apenas esperando orientações sobre o funcionamento do processo de formação do Conselho Cidadania para poder torná-lo realidade. Sua proposta é reunir um grupo de 12 pessoas, que representem os vários setores da comunidade, a fim de captar os anseios e necessidades da maioria. Ela desafiou os presentes a começarem a refletir sobre os candidatos que consideram mais indicados para fazer parte desse grupo. A escolha será por votação direta, provavelmente durante uma reunião convocada especialmente para esse fim.
A criação dos Conselhos de Cidadania, aliada à institucionalização do CRBE confirmam a importância de que todos os setores da comunidade sejam ouvidos. Como enfatizou Carlos Mellinger, “todos somos brasileiros no mundo e todos temos direito à voz”.
A reunião sobre a III Conferência foi organizada pelo Consulado Geral do Brasil em Zurique e contou com o apoio do Conselho Brasileiro na Suíça, da Associação Brasileira de Educação e Cultura (ABEC), de todos os palestrantes e de diversos grupos brasileiros, que auxiliaram na divulgação e garantiram a presença de participantes de várias regiões do país.
Irene Zwetsch, da coordenação da Rede de brasileiras e brasileiros na Europa e do Conselho Brasileiro na Suíça (http://www.rede-brasileira.eu)

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